segunda-feira, 18 de maio de 2015

QUEM É DOUTOR?

No meio acadêmico, doutro é um título oficialmente reservado apenas aos que, após seu primeiro diploma de graduação, obtêm o grau de doutorado. Os médicos, por consideração especial, também ostentam o uso do título de doutor. Porém, independentemente de ter ou não graduação, é comum se chamar de "doutor" o elemento que esteja no poder ou que tenha bastante dinheiro e, por isso, é bajulado. Inclusive, em mel "rol" de conhecidos, alguns adoram se auto-intitular "doutor", como um que, bacharel em direito, não logrou aprovação no exame de Ordem e muito menos fez doutorado ou sequer mestrado, mas, pelo  cargo que exerce em uma instituição pública exige ser tratado por "doutor Fulano". Pensando nisso, lembrei de um fato que presenciei a alguns anos numa cidadezinha as margens do sinuoso Rio Purus, no interior da nossa Amazônia.

Estava de passagem pelo local quando fui convidado para um jantar reunindo as pessoas que, naquele dia, haviam participado da sessão de instalação da 1ª Junta de Conciliação e Julgamento da TRT na cidade. O destaque da mesa era um doutor que viera da capital para a cerimônia. A princípio, numa formalidade incômoda, todos se travam como doutor. Era um tal de "Dr. Fulano" para cá, "Dr. Beltrano" para lá, que sobrou até para mim,  pois fui chamado algumas vezes de "doutor", ainda que explicasse não possuir tão honroso título. Jantar, bebidas, mais bebidas e, aos poucos, os paletós foram para os encostos das cadeiras, as gravatas e as gargantas foram se soltando e os títulos, sumindo. Não demorou muito para descobri que todos os presentes eram funcionários da prefeitura ou aliados do prefeito local, e, por isso, ali estavam, alguns até com promessa de serem contratados para trabalhar na Junta. A exceção, além de mim, era o "de fora", o destaque, tão adulado naquela mesa. Mais alguns goles e o"de fora" me contou que era operário de indústria e que, por suas ações, estava na função de juiz classista (juiz leigo, que era escolhido pelos sindicatos para um mandato temporário na Justiça do Trabalho).

Fiquei imaginando o que pensaria a Juíza da região - ela que veio somente para a instalação da Junta e que, logo em seguida, embarcou no aviãozinho fretado e seguiu sabe Deus para onde - se ali estivesse e visse aquele monte de "doutores" recém-fabricados.

Fonte: Luiz Carlos Albuquerque, consultor comercial, escritor, editor do projeto "Leitura no ônibus" / Jornal Alto Madeira

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